Professora Tania Zagury
Por cerca de dois séculos, família e escola viveram em lua-de-mel. O que a escola determinava, fossem tarefas ou sanções, a família endossava. Assim, crianças e jovens sentiam, nas figuras de autoridade que as orientavam, coesão e homogeneidade. Com isso, o poder educacional das duas instituições alimentava-se mutuamente. E as novas gerações adquiriam seus valores e seus saberes (intelectuais e morais) sem maiores problemas. De repente, observa-se que já não existe essa fé: os pais parecem estar desconfiados de professores e vice-versa. É como se repentinamente o encantamento tivesse se quebrado. O comum hoje é os pais irem à escola questionar desde as tarefas escolares até a avaliação e o calendário, ou, depois de matricularem os filhos, entregarem à escola toda a problemática relacionada à educação (quer se trate de conteúdo ou de formação ética). Ambas as atitudes em nada contribuem para o crescimento intelectual e afetivo de nossas crianças. Se a relação está abalada, devemos buscar as causas para aplainar as arestas que muitas vezes nascem de ideias equivocadas, veiculadas por alarmistas que sequer detêm conhecimentos pedagógicos fundamentando suas críticas. Uma coisa, porém, é certa: quando pais não confiarem mais na escola (e vice-versa), o caos estará instalado e nossos filhos, perdidos.
Acompanhar e zelar para que os filhos recebam da escola a formação necessária é um direito e um dever dos pais. Não se trata, portanto, de postular que o “magister dixit” reencontre espaço numa época em que a razão e a consciência devem ser as molas-mestras das ações de todos. Trata-se antes de evitar que a desconfiança floresça, alimentada pela insegurança que permeia as relações sociais de hoje e que começa a minar também a crença da família na ação da escola.
Por que essa confiança se perdeu? Por vários motivos. Um deles é o fato de que muitos pais têm hoje conhecimentos que os tornam capazes de perceber falhas ocasionalmente cometidas pelas escolas. Mas esse seria o lado positivo, se não houvessem muitos conceitos mal compreendidos. Daí que, por vezes, as reclamações tornam-se infundadas. Reclamar é um direito. Resta saber, do quê e de que forma fazê-lo para não comprometer a confiança que nossos filhos depositam em seus mestres. Talvez seja muito mais perniciosa para uma criança a desconfiança em seus orientadores, do que o fato de esse sentimento ter ou não fundamento.
Algumas agências educacionais de fato atuam quase que exclusivamente voltadas para o lucro. Qualquer instituição tem que, obviamente, ser saudável administrativamente, o que significa arcar com os compromissos e sobreviver com dignidade. Mas, quando se vê que algumas agem apenas em função do sucesso financeiro, pode-se compreender porque a confiança se esvai. A essa lógica equivocada, poderia contrapor que a melhor forma de tornar uma escola lucrativa é investindo na qualidade da educação. É uma fórmula quase milagrosa…
Outro fator é o crescente assoberbamento de funções dos professores: orientação sexual, ecológica, ética, de trânsito são algumas das tarefas que se somaram ao currículo, sem uma contrapartida de incremento de tempo e infraestrutura que possibilitem um trabalho docente eficiente. O que também concorre para a falta de confiança na ação das escolas. Não significa, no entanto, que tudo está perdido, nem que todo professor trabalhe mal. Pelo contrário, em meio a tanta dificuldade – má remuneração, carga horária imensa, excesso de alunos em sala de aula, falta de
limites e de recursos – encontramos milhares de educadores que não abandonam a luta por motivar, ensinar, formar e mostrar aos seus jovens alunos a beleza e o poder das ideias…
Decerto existem outros fatores que agravam o descasamento família/escola. Como, porém, enfrentar essa problemática antes que ela se torne irreversível? É claro que não podemos, num artigo, apresentar soluções para questões estruturais. No entanto, no que tange à relação família x escola, podemos partir de um olhar objetivo, sem preconceitos mútuos. Significa dizer que a solução imediata depende do desejo real de entendimento e harmonização de ambas as partes.
Por parte dos pais constitui, por exemplo, saber priorizar o que é essencial para que os filhos caminhem em direção ao saber e à socialização. Isso inclui posicionar o projeto pedagógico como o quesito “número um” na escolha da escola – e a confiança na opção feita, como base para uma parceria verdadeira.
Por parte da escola, compreende o oferecimento de estratégias eficazes de ensino, avaliação e recuperação. Sem falar da necessidade inquestionável de manter professores atualizados, com domínio de conteúdo e de metodologia. Inclui também, de ambas as partes, a compreensão do conceito de conflito como situação manejável e até enriquecedora, bem distinta de confronto. A presença dos pais na escola, trabalhada adequadamente, traz enfoques de grande valia para o processo pedagógico.
Fundamental é que a credibilidade da agência educadora seja mantida – para o bem dos nossos jovens e da sociedade como um todo.
Fonte: www.taniazagury.com.br